Mordendo a Maçã AI: Magritte e a AI

Caro Magritte (Parte 1)
por Matteo Moriconi em colaboração com Noah Charney

Caro Magritte,

Espero que tudo esteja bem com você. Recentemente, vi uma de suas pinturas, O Filho do Homem, e fiquei impressionado com a imagem da maçã no primeiro plano. Como você sabe, tenho grande interesse na utilização de objetos do cotidiano como tema em minhas produções artísticas, e, devo dizer, a maneira pela qual você retratou aquela maçã é realmente fascinante. Escrevo para perguntar se você estaria disposto a colaborar em um projeto envolvendo o uso de maçãs como símbolo, em nossos respectivos estilos. Acredito que, ao combinar nossas perspectivas únicas, poderíamos criar algo verdadeiramente inovador. Por favor, diga-me se tem interesse. Espero podermos trabalhar juntos.

Atenciosamente, AI.W4rhol.

Salut Magritte,

Nos últimos tempos, tenho explorado o uso de inteligência artificial em minha arte, e gostaria de saber se você estaria interessado em colaborar em uma peça que incorpore essa nova tecnologia. Acredito que, combinando nossas visões, podemos criar uma ilustração verdadeiramente única e instigante, que extrapole os limites da arte contemporânea. Estou particularmente interessado em explorar o uso da AI para gerar imagens abstratas, e em como a AI pode ser usada para aprimorar o aspecto simbólico da maçã, um tema que ambos exploramos. Adoraria saber o que você pensa sobre a ideia e discuti-la mais com você, caso esteja interessado. Acredito que essa colaboração seria uma ótima oportunidade para explorar o potencial da AI na arte e extrapolar os limites da ilustração contemporânea. Por favor, diga-me o que pensa sobre o assunto.

Bien à vous,

Pablo Picasso

Essas duas cartas foram escritas usando o software de AI ChatGPT. Na primeira, solicitei ao software que escrevesse uma carta como se fosse enviada por A.I.W4rhol – pseudônimo que adoto quando utilizo o software de AI Midjourney para criar obras no estilo de Andy Warhol – a Magritte sobre colaborarem na pintura de uma maçã. Na segunda carta, pedi ao ChatGPT para escrever como se fosse Pablo Picasso convidando Magritte para uma colaboração.

Por que Magritte, você pode se perguntar, de todos os artistas que eu poderia escolher?

Magritte é ideal para uma discussão sobre criações de AI, quando consideramos uma de suas citações: “Um rosto não é um rosto a não ser que esteja olhando para você”. Magritte era profundamente interessado na união de semântica e semiótica. Semântica envolve o uso da linguagem, enquanto semiótica é o estudo dos signos e dos símbolos no processamento do significado. Elas se unem quando questionamos como a linguagem – frases e palavras – transmitem significado. Além do uso da semiótica, as pinturas de Magritte frequentemente contêm elementos incomuns ou a sensação de que algo é familiar e estranho ao mesmo tempo. Esse elemento contribui para a atmosfera onírica e surreal de seu trabalho e desafia ainda mais a compreensão do espectador sobre a realidade.

Consideremos, primeiramente, como Magritte usou as palavras para fazer seu público considerar mais ativamente a maneira como falamos, lemos e pensamos sobre palavras, imagens e realidade. Provavelmente sua obra mais famosa – A traição das Imagens –  Ceci n’est pas Une Pipe (1929) – uma obra tão instigante que o filósofo Michel Foucault escreveu um livro inteiro sobre a ela – é uma pintura de um cachimbo com as palavras “Isto não é um cachimbo” escritas em baixo. Ao vermos o quadro, se nos perguntassem o que Magritte pintou, responderíamos, “é um cachimbo”. Magritte está mexendo com nossa mente, ao insistir “Não, isto não é um cachimbo. É a pintura de um cachimbo”. Mas o que queremos dizer com “cachimbo”, afinal?, ele continua. Na gíria francesa da época, “une pipe” era um termo para… bem, não exatamente um cachimbo. Os jogos mentais de Magritte provocam deleite ao levar o público a uma armadilha amigável, para fazê-lo mudar a marcha e os processos do pensamento, inquietando-o intencionalmente.

Essa pintura é um comentário sobre a relação entre um signo e aquilo que ele representa. Ele força o espectador a questionar a natureza da representação e os limites da linguagem. Magritte usava, frequentemente, objetos do cotidiano – como cachimbos ou maçãs – em suas pinturas. Mas ele os manipulava de forma a fazê-los parecer estranhos e misteriosos, como ao fazê-los flutuar ou tornando-os enormes. Essa técnica, conhecida como “desfamiliarização” servia para romper as expectativas do espectador e desafiar sua compreensão da realidade.

Outro tema recorrente no trabalho de Magritte é o uso da ocultação e do disfarce. Ele frequentemente retratava pessoas com seus rostos escondidos por objetos como maçãs, chapéus-coco ou nuvens, sugerindo a ideia de que a identidade não é fixa e pode ser escondida ou disfarçada. Esse tema pode ser visto em quadros como O Assassino Ameaçado e A Condição Humana.